Diante da natureza securitária e previdenciária complementar dos contratos de seguros de pessoas, é inconstitucional a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD (CF/1988, art. 155, I) sobre os valores e direitos transferidos aos beneficiários dos planos Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) e Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) em caso de falecimento de seu titular.

DIREITO TRIBUTÁRIO – IMPOSTOS; ITCMD; FATO GERADOR; NÃO INCIDÊNCIA

DIREITO CIVIL – CONTRATOS EM ESPÉCIE; SEGURO DE PESSOA; SEGURO DE VIDA; PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR; PLANO GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE (PGBL); VIDA GERADOR DE BENEFÍCIO LIVRE (VGBL); DIREITOS REAIS; RESERVA DE USUFRUTO

 

 ITCMD: incidência do imposto sobre o plano VGBL e o PGBL na hipótese de morte do titular – RE 1.363.013/RJ (Tema 1.214 RG)  Tese fixada:

“É inconstitucional a incidência do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD) sobre o repasse aos beneficiários de valores e direitos relativos ao plano vida gerador de benefício livre (VGBL) ou ao plano gerador de benefício livre (PGBL) na hipótese de morte do titular do plano.”

 

Resumo:

Diante da natureza securitária e previdenciária complementar dos contratos de seguros de pessoas, é inconstitucional a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD (CF/1988, art. 155, I) sobre os valores e direitos transferidos aos beneficiários dos planos Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL) e Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) em caso de falecimento de seu titular.

O ITCMD é um imposto que tem como hipótese de incidência a transmissão da propriedade de bens e direitos em decorrência (i) do falecimento de seu titular (causa mortis); ou (ii) de cessão gratuita (doação). Inexiste, em ambos os casos, qualquer contraprestação, tendo em conta que a ausência de onerosidade é o traço comum entre tais transmissões.

O plano VGBL possui natureza jurídica de seguro de pessoa, cujo objetivo é pagar uma indenização ao segurado sob a forma de renda ou pagamento único, em função de sua sobrevivência ao período de diferimento contratado (CC/2002, art. 789). Assim, no caso de falecimento do titular do plano, o VGBL assume o caráter de seguro de vida, com estipulação em favor de terceiro (1).

No que tange ao plano PGBL, apesar de classificado juridicamente como plano de previdência complementar, também possui características de seguro de pessoa no caso de falecimento do titular.

Dessa forma, o benefício repassado ao beneficiário dos planos PGBL ou VGBL, diante da morte do segurado, não possui natureza jurídica de herança ou legado (CC/2002, art. 794), mas de direito próprio decorrente de contrato (CC/2002, art. 757), na medida em que não faz parte do acervo patrimonial ou inventário do de cujus (2). Como inexiste transmissão causa mortis (Lei nº 11.196/2005, art. 79) não há o critério material que possibilita a tributação pelo ITCMD (3).

É constitucional o diferimento do pagamento do ITCMD em casos de doação com reserva de usufruto.

Isso porque a instituição de hipótese de recolhimento de parte do imposto para momento posterior ao do fato gerador que já tenha ocorrido encontra-se no âmbito de conformação do legislador estadual.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, ao apreciar o Tema 1.214 da repercussão geral(i) deu provimento ao recurso extraordinário da Federação Nacional das Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e de Previdência Complementar Aberta (FENASEG) para declarar a inconstitucionalidade da incidência do ITCMD, disciplinado nos arts. 13, II e parágrafo único, e 23, ambos da Lei nº 7.174/2015 do Estado do Rio de Janeiro, quanto ao repasse para os beneficiários de valores e direitos relativos ao PGBL na hipótese de morte do titular do plano; (ii) deu parcial provimento ao recurso extraordinário do Estado do Rio de Janeiro, a fim de assentar a constitucionalidade do art. 42 da mesma lei estadual (4); e (iii) fixou a tese anteriormente mencionada.

 

(1) CC/2002: “Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores.”

(2) CC/2002: “Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados (…) Art. 794. No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.”

(3) Lei nº 11.196/2005: “Art. 79. No caso de morte do participante ou segurado dos planos e seguros de que trata o art. 76 desta Lei, os seus beneficiários poderão optar pelo resgate das quotas ou pelo recebimento de benefício de caráter continuado previsto em contrato, independentemente da abertura de inventário ou procedimento semelhante.”

(4) Lei nº 7.174/2015 do Estado do Rio de Janeiro: “Art. 13. São responsáveis pela retenção e recolhimento do imposto: (…) II – as entidades de previdência complementar, bem como as sociedades seguradoras autorizadas, na hipótese da transmissão causa mortis referida no art. 23. Parágrafo único. Não efetuada a retenção referida no caput deste artigo, o pagamento do imposto pode ser exigido do responsável ou do contribuinte. (…) Art. 23. Na transmissão causa mortis de valores e direitos relativos a planos de previdência complementar com cobertura por sobrevivência, estruturados sob o regime financeiro de capitalização, tais como Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) ou Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), para os beneficiários indicados pelo falecido ou pela legislação, a base de cálculo é: I – o valor total das quotas dos fundos de investimento, vinculados ao plano de que o falecido era titular na data do fato gerador, se o óbito ocorrer antes do recebimento do benefício; ou II – o valor total do saldo da provisão matemática de benefícios concedidos, na data do fato gerador, se o óbito ocorrer durante a fase de recebimento da renda. (…) Art. 42. Por ocasião da extinção de direito real reservado pelo transmitente quando da transmissão da titularidade do bem, realizada anteriormente à produção de efeitos deste artigo, deverá ser paga a segunda parcela do imposto, em complemento à primeira parcela de 50% (cinquenta por cento), recolhida no momento da ocorrência do fato gerador.”

RE 1.363.013/RJ, relator Ministro Dias Toffoli, julgamento virtual finalizado em 13.12.2024 (sexta-feira), às 23:59

 

Para saber mais entre em contato conosco luciano@lucianomazzardo.com.br